sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Nocturnal Animals (2016)


Há algo de David Lynch nestes Animais Nocturnos. A sua estética e narrativa fragmentada fazem com que Tom Ford seja algo mais que apenas um estilista de decidiu fazer filmes. A grande pergunta é se o estilo estético deste vai e vem narrativo, que pula entre a depressão da galerista burguesa e cínica interpretada por Amy Adams e o drama de uma família que atravessa o Texas durante a noite liderada por Jake Gyllenhaal, tem substância suficiente para o acompanhar. A resposta é sim, claro que sim. Este não se trata de um filme puramente bem realizado que depois acaba sendo um vazio. Não. A sua narrativa e personagens, verdadeiramente nocturnas no sentido figurado, taciturnas, que não mostram alegria, desenvolvem-se nas várias fragmentações do filme, compondo um thriller de rara apreensão e desconforto para o espectador. É certo que há algo do seu autor por aqui, Tom Ford nasceu e cresceu no Texas e talvez exista aqui alguma mensagem sobre os horrores que aquelas longas estradas desertas podem criar no subconsciente do espectador, e aí Nocturnal Animals é exímio. E então entra em cena Michael Shannon, num papel secundário que quase leva o filme só para si, numa interpretação, para não variar, brilhante, aqui de um ranger texano frio que nem uma rocha e que não tem nada a perder (a lembrar, a espaços, Iceman de 2012). Segue-se, como já o era desde o início, um filme cruel e cínico cheio de pequenas pedras preciosas para admirar, quase moralista mas sem nunca o esfregar propriamente na cara de quem o vê. Nocturnal Animals é como um pássaro mitológico com várias asas que acaba por nunca se desequilibrar. É um dos filmes mais interessantes de 2016 que de arrogância estética nada tem, ainda que se cheire, e muito, o seu perfume decorativo. Mas isso já será mais vaidade de Tom Ford, e nós aceitamos.

Porque é bom: A estética do filme é maravilhosa, personagens interpretadas de forma inspirada; o moralismo cínico, a caricatura da sociedade burguesa da arte e a sua dicotomia com o Texas deserto e assustador são fabulosas.

Porque é mau: A sua fragmentação pode criar confusão e sensação de arrogância perante o espectador, um pouco como acontece com Mulholland Dr. de David Lynch

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