Motelx 2019
A 13ª Edição do Motelx, com uma
sexta-feira 13 pelo meio, foi a mais concorrida de sempre até hoje. Ari Aster,
realizador do fenómeno Hereditary foi o convidado de honra e veio apresentar
Midsommar, a sua mais recente incursão no folk horror. Foi uma edição com uma
oferta acima do normal a nível de qualidade, com vários filmes a surpreender muito
pela positiva e a mostrar que o Motelx está cada vez mais forte, com cada vez
maior qualidade e uma programação cada vez melhor. O melhor filme que passou
pelo festival foi mesmo o excelente Midsommar que merecerá crítica própria, mas
nem só de Ari Aster foi feita esta edição:
Ma (2019)


The Gangster, The Cop and The Devil (2019)
Estamos habituados a ver
excelentes thrillers policiais nascer na Coreia do Sul na última década, mas
este The Gangster, The Cop and The Devil, apesar de altamente prazeroso não
consegue satisfazer os fãs do género mais exigentes. Partindo de uma união
improvável entre um líder gangster e um polícia com o objectivo de capturar um
serial killer, The Gangster, The Cop and The Devil é demasiado sensacionalista
para o seu próprio bem, que apenas resultam num por vezes refinado humor negro
altamente satisfatório. No que toca ao realismo do thriller que já esperamos de
filmes como The Chaser, esta oferta do Motelx ficou curta, mas ainda assim foi
uma bela sessão da meia-noite.

Carmilla (2019)
Foi no segundo dia, com Carmilla,
que o Motelx realmente elevou a fasquia. Uma história de amor gótico passada
algures no Século XVIII vai encontrar uma jovem rapariga que vive numa mansão
com o seu pai e governanta na fase de transição para a idade adulta, de
descoberta do corpo e do pecado, após uma misteriosa jovem da sua idade ter
aparecido à porta da mansão após a carruagem onde seguia ter tido um acidente.
Baseado num conto com o mesmo nome, Carmilla encontra identidade nas paredes do
misterioso gótico e folclore religioso, com uma realização onírica e etérea
através da lente da realizadora Emily Harris, que não se coíbe de olhar com o
seu olho também feminino a sexualidade das duas jovens protagonistas. Duas
belíssimas interpretações magnéticas que transportam o espectador para “aquele
tempo”, para os mitos e receios de época, para o isolamento que tantas vezes
percorria a vida de determinadas famílias burguesas e que apenas ouvem os
rumores que se ouvem na cidade mais próxima. Atmosférico e excepcionalmente realizado,
Carmilla é um filme admirável.

I See You (2019)
Um dos filmes mais interessantes
e originais (será que se pode chamar isso a algum filme em 2019?) a passar por
esta edição do Motelx, I See You apresenta-se com uma estrutura invulgar,
iniciando-se no terror home invasion e terminando numa espécie de found footage
inesperada. A veterana Helen Hunt faz parte do elenco, enquanto mãe e esposa de
uma família de classe média alta que traiu o marido, e cujo filho encontra
dificuldades em a perdoar por esse erro. Repleto de curvas e contra-curvas
poder-se-á dizer que o argumento de I See You é algo erróneo, mas a sua
estrutura original multi-género e ao mesmo tempo o despretensiosismo na construção
do seu próprio puzzle elevando-no para algo mais que apenas mais uma pequena
experiência feita em cinema. O filme de Adam Randall é entretenimento puro, e é
altamente eficaz na sua missão.

A Good Woman is Hard to Find (2019)


The Hole in the Ground (2019)
Um dos grandes destaques
positivos, Hole in the Ground foi o melhor de filme de puro terror que passou
pelo Motelx. Uma mãe solteira, habilmente interpretada por Seána Kerslake que
agraciou o festival com a sua presença, move-se para uma vila tranquila com o
seu filho junto a uma misteriosa cratera na floresta. Jogando com os fantasmas
do drama social, mas nunca tirando o foco do horror, o estreante Lee Cronin não
está interessado em fugir da linguagem de género, mas não se coíbe de a aplicar
da forma mais eficaz possível. Com uma estética e atmosfera irrepreensíveis, é
difícil castigar o argumento pelo seu twist final, misturando paranóia,
sobrenatural e horror de criatura. Todos os seus componentes estão tão seguros
de si que não será asneira nenhuma dizer que The Hole in the Ground consegue
competir ombro a ombro com o recentemente filme de terror de culto Babadook.

Harpoon (2019)


The Pool (2019)
A premissa de The Pool, exibido
depois de Harpoon, cerca ds 2h da manhã, que nos chega da Tailândia, permite
antever o nível daquilo que iremos ver, exigindo uma mente aberta: um sujeito
que fica preso dentro de uma enorme piscina, sem escada para sair, e com um
crocodilo a fazer companhia. Ao contrário de Harpoon, The Pool não consegue
abraçar o amadorismo da sua produção e é um desfilar de momentos de vergonha
alheia argumentativos, de interpretação e de caracterização. Um filme que se
quer sério, mas que mais não conseguiu que soltar risadas dos resistentes
espectadores que ficaram pela. Não chega a atingir o estatuto de ser tão mau que
é bom, mas a sua inocência e boa vontade não permite que se lhe sejam atribuas
0 estrelas.

Faz-me Companhia (2019)
Primeira longa metragem do
realizador português Gonçalo Almeida, que havia vencido já o prémio de melhor
curta do Motelx com Thursday Night, Faz-me Companhia foi um dos filmes a
concurso para melhor longa metragem de terror europeia. Um filme onírico e
etéreo que acompanha o fim de semana romântico de duas amantes numa moradia
algures na costa alentejana, Faz-me Companhia comprova sem margem para dúvidas
que Gonçalo Almeida é um realizador a ter em atenção para o futuro. A
fotografia e a realização, a lembrar filmes como Hagazussa (vencedor deste
prémio na edição do ano passado do Motelx) elevam o cinema de Gonçalo Almeida
para outros patamares, e a escolha de dirigir o argumento misterioso pelo drama
psicológico e de paranóia ds suas protagonistas permite ao espectador saborear,
a seu tempo, um filme que se constrói com deleite artístico. Cleia Almeida e
Filipa Areosa entregam duas belíssimas interpretações neste que é provavelmente
o filme português de género mais interessante desde Coisa Ruim. Estaremos
atentos ao futuro de Gonçalo Almeida e que Faz-me Companhia seja o incentivo
para que o cinema português aposto mais na oferta do cinema de terror.

The Lodge (2019)
Outro belíssimo filme de terror
nesta edição do Motelx, com a presença dos realizadores Severin Fiala e
Veronika Franz, The Lodge é uma lição sobre como filmar a claustrofobia e a
paranóia naquele que foi provavelmente o melhor filme a ser exibido no festival
a seguir a Midsommar. Um filme que joga com o trauma de infância da sua
protagonista, a madrasta que se vê isolada numa casa perdida na neve com os
dois filhos do seu companheiro, The Lodge vai beber, descaradamente, às
influências de The Thing ou The Shinning. Os realizadores, igualmente
argumentistas, conseguem criar uma atmosfera psicologicamente adversa, desconcertante
e desnorteante, tanto para os seus protagonistas como para o espectador. The
Lodge é um filme cruel, mas não implacável, que alimentará os fãs do género e
seria uma pena se não tivesse direito a estreia comercial no nosso país.

Come to Daddy (2019)

