quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

I, Daniel Blake (2016)


Chegado aos 80 anos, o britânico Ken Loach entrega, como que fechando com chave de ouro a sua carreira (a reforma já está anunciada), aquele que será porventura o seu mais reconhecido filme entre público e crítica. Quem vê I, Daniel Blake rasga-se em elogios ao seu cinema denunciador de uma máquina burocrática estadual pesadíssima que nada mais faz do que dificultar e minar a vida dos cidadãos, retratando também, ainda que num pequeno foco de Newcastle, as dificuldades do cidadão pobre que não pode olhar a meios para prover o seu sustento (e da sua família) uma vez que o estado social tarda em cumprir as suas obrigações. É aí que I, Daniel Blake se torna num filme algo dicotómico. Por um lado toda a sua temática é redundante, e é difícil não antever a quase totalidade do seu argumento, num drama (e não dramalhão) que até tem toques de humor antes do real peso da sua mensagem passar para o espectador, tal não é o surrealismo que esta gente necessitada e aflita tem que enfrentar quando pretende reclamar os seus direitos. Qualquer cidadão médio que tenha tido contacto com todas as dificuldades sociais e burocráticas que minam o Estado em princípio conhecerá, infelizmente bem, esta realidade. No entanto, este não é um filme que faz da denúncia básica a sua principal arma, como se estivesse a fazer apologia ao sentimentalismo nascido da frieza da sua odiosa temática, explorando-a até à última das casas como se o seu objectivo fosse arrancar todas as lágrimas do espectador até à última gota como outros adoram impunemente fazer. Não. I, Daniel Blake não vive de artifícios e manhas. É um filme honesto e retrata a realidade como ela é, sem hipérboles, com boas performances de todos os seus actores que curiosamente nem têm grande experiência na interpretação, e no cinema quase nenhuma. Mas também não se trata duma obra prima social visceral como são, por exemplo, Tokyo Story de Ôzu (1953) ou Cavalo Dinheiro (2014) de Pedro Costa, entre outros (Pedro Costa é até provavelmente o melhor realizador no activo a nível mundial a realizar este tipo de cinema e Cavalo Dinheiro é tão bom que à data ainda não nos atrevemos a escrever aqui sobre ele). A nível cinematográfico e imagético também não se pode dizer que I, Daniel Blake seja um filme particularmente interessante. O que aqui importa é o seu retrato, crú, mas inspirador, implacável mas esperançoso. Ainda há gente boa por aí.

Porque é bom: O retrato objectivo e apolitizado do inferno burocrático que é o estado social; a performance de Dave Johns.

Porque é mau: Em termos estéticos I, Daniel Blake tem pouco a oferecer.

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