segunda-feira, 6 de março de 2017

John Wick: Chapter 2 (2017)


O primeiro John Wick foi uma injecção de criatividade conceptual, visual e coreográfica num cinema de acção que está desgastado e viciado em franquias, sequelas e determinados heróis/actores que parecem destinados a ocupar todos os papéis principais do género. A ideia do realizador Chad Stahelski de escolher Keanu Reeves para interpretar John Wick é algo que se confunde com a direcção da própria carreira do actor, acusado de apático e de capacidade interpretativa limitada. Parece que Keanu Reeves nasceu para isto, ser um assassino de técnica implacável, estilo e poucas palavras, e é curioso ver como nesta sequela o mesmo realizador volta a jogar com essa ambiguidade, voltando a juntar Keanu com Laurence Fishburne depois da trilogia de Matrix. Queríamos muito, mesmo muito, que John Wick 2 fosse ainda melhor que o primeiro, o que quereria dizer que seria uma obra prima, provavelmente o melhor filme de acção deste século, mas muito infelizmente não se pode dizer isso. A sequela continua muito boa em tudo, mas tal como Matrix Reloaded havia feito, limita-se, no seu cerne conceptual, a expandir aquilo que já havia sussurrado no primeiro filme, sempre de forma misteriosa e não concretizada. Conceitos vagos como a existência de uma rede/submundo de assassinos, um Hotel a eles dirigido dentro do qual não se podem tratar de "negócios", uma moeda própria, tudo isso acaba por ser expandido e melhor explicado em John Wick 2, e isso acaba por ser uma faca de dois gumes. Ao quebrar o mistério quebra-se também a magia, a inocência de um filme auto-explicativo em que um anti-herói é apenas movido pelo roubo do seu carro e o assassinato do seu cãozito, num misto de humor aberrante, estilo e sobriedade. A sequela parece consciente disso e exprime-o através da personagem de Peter Stormare (interpretando o irmão do vilão do primeiro filme, qual Jeremy Irons a interpretar o irmão de Hans Gruber em Die Hard 3: A Vingança) na sua excelente cena de acção de abertura, longuíssima, em que Wick se dirige sozinho a um armazém da máfia russa ocupado por dezenas de mercenários para recuperar o seu carro. Apesar do abanar da chama que dava uma alma tosca e inocente ao primeiro filme, John Wick 2 continua fantástico em tudo aquilo que realmente interessa. Coreografias extraordinárias, personagens carismáticas e um total despretensiosismo em querer ser mais do que aquilo que é. E depois a cinematografia, a soberba cinematografia que já fazia do primeiro filme um fora de série em que até o diálogo mais simples é cuidadosamente filmado em imagem de composição rica, de um visual neo-noir cheio de identidade que não se inibe de prestar homenagem (ou quase vassalagem) a algumas das suas principais influências, nomeadamente a brilhantemente executada cena da exposição de espelhos, a melhor do filme, referência directa a Enter de Dragon com Bruce Lee. É isso que define John Wick 2. Um filme com uma identidade única sobre a economia do movimento, a perseguição, a emboscada, tudo descrito numa tela de composição rica e cinematograficamente superior. John Wick 2 não é o melhor filme de acção da década, mas é talvez o segundo melhor, logo a seguir ao seu predecessor.

Porque é bom: As coreografias de combate; a cinematografia; a forma despretensiosa como tudo é mostrado ao espectador; a caracterização do mundo hermético de John Wick; a cena dos espelhos e a cena de abertura são sequência de acção de antologia.

Porque é mau: Assim como Matrix Reloaded fez em relação a Matrix, John Wick 2 limita-se a expandir o que já havia apresentado ao invés de criar algo novo e excitante para o espectador.

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