quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Hidden Figures (2016)


Além de celebrar o cinema enquanto indústria, os Óscares são cada vez mais uma plataforma de excelência para celebrar histórias inspiradoras num determinado contexto social, aproveitando o seu mediatismo para chamar a atenção aos espectadores para certos momentos ou questões fracturantes. É por isso que filmes como Hidden Figures continuam a ser nomeados ano após ano, uns melhores, como foi Spotlight, outros menores, como foi Imitation Game. Quanto a este Hidden Figures é um filme uniformemente simpático, que não se atira de cabeça (é cauteloso) e nunca assume a profundidade que por vezes finge ter e não tem. Conta a história de 3 matemáticas afro-americanas, entre outras, que no início da década de 60 tiveram um importante papel na corrida para o espaço da NASA. Ou pelo menos é isso que aparenta ser, porque na realidade Hidden Figures é mais sobre Katherine Goble (bela interpretação de Taraji P. Henson) do que propriamente as suas duas asas na película, parecendo que se tentou aqui fazer um 3 em 1 que acaba por nunca ser satisfatoriamente desenvolvido à excepção da primeira. Aqui fala-se um pouco de tudo, por entre desequilíbrios sempre estancados pelas, mais uma vez uniformemente simpáticas, boas interpretações e uma realização tradicionalista segura. Pisca-se o olho, com as devidas aspas, a temas como a segregação racial, à data combatida por Martin Luther King, ao sentimento anti-comunista e anti União Soviética (esse muito melhor aceite pelo próprio filme que o anterior), e a desigualdade de género, nunca se aprofundando ou assumindo realmente nenhum deles. Paralelamente, saltitando de abordagem social superficial uma a seguir a outra, Hidden Figures passa uma boa dose do seu tempo com macaquices matemáticas que poucos espectadores irão compreender e que talvez por esse motivo irão também bocejar ou pasmar, à la Christopher Nolan, tal não é o peso de tanto número complicado que estas senhoras calculam. E há tantos filmes a cometer este último erro (?) que Hidden Figures bem já podia tê-lo evitado. Quem merece uma palavra também, e que acaba por ser a constante que mantém o filme no caminho certo, é Kevin Costner, a já antiga companhia fiável do espectador, qual Tom Hanks, com quem qualquer pessoa se sentiria bem e sobre o qual escrevemos aquando da crítica a Bridge of Spies. No fundo, Hidden Figures é como se fosse uma tarefa, tanto para quem o fez, como para quem o vê: é o tipo de filme que mais cedo ou mais tarde seria realizado, e também é aquilo que o espectador espera exactamente que seja. Socialmente interessante, cinematograficamente irrelevante, mas ainda assim com qualidade e coração suficiente para ser bem apreciado.

Porque é bom: Boas interpretações de Taraji Henson e Kevin Costner; interessantes trejeitos sobre o real funcionamento da NASA no início da década de 60; alguns apontamentos sociais relevantes; coração grande.

Porque é mau: Nunca aprofunda nenhuma das questões sociais que parece ter medo de abordar eficazmente; demasiado detalhe matemático incompreensível para o espectador médio; irrelevante enquanto objecto cinematográfico, desequilibrado em termos argumentativos, com vários picos de protagonismo pouco interligados.

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