terça-feira, 10 de abril de 2018

The Wailing (2016)


Havia muita expectativa para este The Wailing que não só foi correspondida como ultrapassada, e a prova disso é a sua estreia em sala em Portugal dois anos depois da sua estreia no festival de cinema Motelx, algo que raramente, para não dizer nunca, acontece. E não devemos falar dele de forma leve. Estamos perante um dos melhores thrillers sobrenaturais jamais realizados e há que dizê-lo sem pudores. O realizador sul-coreano Hong-jin Na já havia dados provas fortíssimas da sua habilidade com o seu primeiro filme, The Chaser, um thriller policial que, libertando-nos das regras desse género no cinema americano, conseguia olhar olhos nos olhos portentos como Se7en de David Fincher. Com The Wailing o realizador mantém a fórmula base, mas adiciona-lhe o ingrediente do mistério sobrenatural, o que faz toda a diferença e eleva a linguagem do seu cinema de género para algo com assinatura de autor, um sentimento orgânico tão raramente sentido nessa corrente pejada de clichés e linguagem cinematográfica derivativa. Seguimos a personagem principal habilmente interpretada por Do Won Kwak, um polícia de uma pequena vila sul coreana, trapalhão, cobarde, mas com um coração grande, que se vê deparado com uma série de mortes inexplicáveis e violentas na sua vila que começam a ocorrer após um solitário japonês (outra enorme interpretação, de Jun Kunimura) se ter mudado para as redondezas. O filme, de cerca de duas horas e meia, progride a um ritmo progressivo exacto, qual relógio suiço, num misto de influências que vão da comédia do cinema familiar, do trabalho e da relação com o polícia parceiro, ao adensar de um mistério surreal, mas ao mesmo tempo real, explorando os medos e crenças de cada um, e aqui desta pequena comunidade sul-coreana, analisada qual aquário. Há algo de estranhamente realista em The Wailing. O comportamento das suas personagens, a actuação da polícia, as suas famílias, as suas fragilidades e medos, a chuva, os automóveis, as refeições... Parece que Hong-jin Na tem essa preocupação, de trazer o espectador a um filme fantasioso que talvez, quem sabe, até pudesse ser real. Já havia essa sensação em The Chaser, mas aqui o prazer é diferente. Temos um mistério para resolver! E tudo isto podia ser aborrecido num filme tão longo, mas não é. Nunca. The Wailing vai-se renovando, inicialmente comédia leve  encaminhando-se pé ante pé para um horror sufocante, com inúmeros elementos de folclore local que dão ainda mais conteúdo e interesse à trama. Tudo isto se alia a uma cinematografia riquíssima, numa boa variedade de cenários, com planos meticulosamente construídos, objecto por objecto, num detalhamento visualmente tão delicioso que quase o conseguimos cheirar. Não há nada de negativo a apontar nesta experiência atordoante que sabe exactamente aquilo que está a fazer. Foi para filmes como The Wailing que nasceu o cinema de entretenimento.

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