Nicolas
Pesce, realizador do desconcertante The Eyes of My Mother, protagonizado pela
portuguesa Kika Magalhães, regressa ao cinema provocatório com este Piercing,
inspirado no mesmo livro que inspirou o filme de culto Audition de Takashi
Miike. Neste filme de “actores” Christopher Abbot contracena com Mia
Wasikowska, duas interpretações hipnóticas e estranhamente reconfortantes. Ele,
um homem de família que planeia matar uma aleatória prostituta com um picador
de gelo. Ela, uma prostituta que é menos inocente do que aparenta. Com uma química
astuta, Abbot e Wasikowska complementam-se numa noite esteticamente delirante
nas mãos de uma realização deliciosamente criativa de Pesce. Na verdade, o
pequeno Mundo hermético de quarto de hotel de Piercing parece ter vida própria,
englobando o espectador como voyeur da doentia fantasia do protagonista que
recebe mais do que aquilo que planeava. Um design sonoro estimulante e uma
banda sonora onírica e contemplativa, com um filtro de cores que não se rende
ao facilitismo da corrente neo-noir recente, Pesce criou mais uma brilhante
guloseima cinematográfica que apenas se fragiliza no seu argumento. Com efeito,
conduzindo habilmente o espectador pela mente retorcida do duo de
protagonistas, Pesce constrói um argumento labiríntico que aparenta não ter saída.
Perante essa parede, Pesce decide terminar o filme ao invés de o elevar a um
patamar ainda mais provocatório e criativo à semelhança do que Miike fez com
Audition. Má decisão. Abbot e Wasikowska ainda tinham muito para dar e o
espectador, o pretenso observador escondido na sala de cinema, estava
interessado em ver.
Porque é bom: O efeito onírico que a realização de Pesce atribui ao cenário fechado de Piercing; duas belíssimas interpretações; um thriller voyeurista criativo sonora e visualmente, que coloca o espectador numa posição rara.
Porque é mau: Fica a vontade de ver mais destes dois protagonistas tão singulares; Pesce não arrisca a dar desenlace ao seu argumento labiríntico
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