quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Mandy (2018)


Mandy, a trip alucinatória movida a lsd de Panos Cosmatos, protagonizada por Nicolas Cage, não é exactamente aquilo que aparenta, mas é precisamente nessa indecisão quanto à forma que acaba por perder a sua força. Aquilo que aparentava ser um revenge movie ao estilo grindhouse, com Nic Cage a regressar ao território onde o seu carisma melhor dá cartas, é afinal uma obra cinematográfica de experimentalismo formal e estético, relembrando, pelas piores razões, detritos abjectos como Spring Breakers ou algum do pior cinema de Nicolas Winding Refn. Cage vive com a sua companheira, a titular Mandy, numa casa algures nas montanhas do interior dos Estados Unidos, quando um culto religioso decide perturbar a sua idílica vida romântica, soltando a fúria do protagonista. O problema é que na tela o desenvolvimento da trama não funciona exactamente assim, com um ritmo lento e pantanoso, coberto de filtros de cor neo noir, dando mais protagonismo ao culto vilão e à irritante Mandy que propriamente à acção e loucura de Cage, cujo tempo de écrã é na verdade reduzido. É impossível fugir ao pensamento de que Mandy é, afinal de contas, um filme artisticamente pretensioso que não sabe o que fazer com aquele que é, de longe, o seu maior trunfo, e pior, conscientemente coloca-o em segundo plano, preferindo os devaneios estéticos e diálogos filosófico-balofos do pastor do culto à vingança propriamente dita que o filme teima em insinuar e prometer, mas que acaba por entregar de forma insuficiente e titubeante. Por outro lado é inegável o mérito estético que o filme apresenta. A sua criatividade, embora gratuita e inconsequente, compõe belos planos imagéticos. É também inegável que das poucas vezes que temos o prazer de ver Nicolas Cage a trabalhar o veterano actor protagoniza cenas poderosas com uma maravilhosa entrega. Fica um sabor agridoce. Dependerá da disposição do espectador e do seu gosto pessoal, mas Mandy enquanto conjunto será objectivamente um filme desequilibrado e com um rumo incerto que, isoladamente, tem o mérito de apresentar sequências visuais e de acção com o potencial de atingir o culto cinematográfico.

Porque é bom: Ver Nicolas Cage em boa forma é um regalo e cada uma das suas cenas vale bem o preço do bilhete; realização esteticamente marcante e onírica, num belo exercício de experimentalismo formal.

Porque é mau: O filme desequilibra-se entre um pretensioso auto-elogio imagético e o libertar do potencial de Nicolas Cage, que parece ter pouco espaço para trabalhar; o pretenciosismo neo-noir de Panos Cosmatos é por vezes difícil de digerir, arrastando-se sem rumo por demasiado tempo, focando-se num rol de vilões que não é tão interessante como julga ser

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