terça-feira, 21 de março de 2017

The Eyes of my Mother (2016)


Ao filmar The Eyes of My Mother o jovem realizador de 26 anos Nicolas Pesce demonstra com este seu primeiro filme que existem mentes criativas que apenas precisam duma lente de camera para desafiar regras e convenções de género, criar arte, e aqui um produto perturbantemente original que, apesar de todo o "detalhismo" quase clínico, consegue escapar à aura de pretensiosismo que muitas vezes mancha o início de carreira de tantos jovens realizadores que não estão limitados por exigências de estúdio. Francisca, interpretada pela portuguesa Kika Magalhães (enquanto jovem adulta), é uma rapariga ensinada pela mãe, uma antiga cirurgiã em Portugal, a não questionar ou deixar-se impressionar pela morte até ao dia em que um acontecimento inesperado dita o seu isolamento na sua casa de família perdida algures da ruralidade dos Estados Unidos. Em entrevista, o realizador italo-americano disse que queria dar ao filme uma aura ambígua de filme estrangeiro e ao conhecer Kika Magalhães pouco depois da actriz ter emigrado para os Estados Unidos apercebeu-se de como poderia trabalhar alguma dessa identidade portuguesa, o que só acrescenta à autenticidade. The Eyes of My Mother desafia a lógica do espectador, a sua piedade por Francisca ao mesmo tempo que alimenta a sua repulsa perante esta monstruosa heroína, traumatizada pelo maior de todos os traumas que é não ter quem mais ama. A sua incessante procura pela companhia da mãe, por entre murmúrios em português e um melancólico fado de Amália tocado em vinil, é algo de desconfortavelmente arrasador, sempre filmado num subjectivamente desencantado mas belíssimo preto e branco que esbate ainda mais as emoções, numa evocação do expressionismo alemão detalhado. Há algo de horror exploitation neste Eyes of My Mother, alguma influência do infame Martyrs e da sua corrente do "novo extremismo francês", enfim, toda uma lógica narrativa e visual brilhantemente cuidada. Eyes of My Mother é um filme perturbador, original, criativo, com um monstro ambiguamente desenvolvido de forma brilhante por Kika Magalhães. Seria bom que o nosso país lhe desse o merecido mérito.

Porque é bom: Toda a criatividade e originalidade narrativa e visual, perturbante e melancólica, que joga com a aura cultural portuguesa num resultado magnificamente desolador; a portuguesa Kika Magalhães tem uma excelente interpretação; evoca o expressionismo alemão e o movimento de "novo extremismo francês" com cuidada capacidade de procurar o seu próprio lugar.

Porque é mau: O facto de ser a preto e branco, ter pouco diálogo e desenrolar-se a ritmo lento num cenário hermético afastará o espectador adepto do terror mais imediato e convencional; será certamente demasiado doentio para alguns.

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