terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

The Post (2017)



Chegámos a um ponto em que ver Spielberg, ou qualquer outro realizador na veia do cinema comercial norte-americano de qualidade, a dirigir Meryl Streep ou Tom Hanks, e aqui ambos, se tornou um mero exercício de rotina, uma espécie de "vamos lá fazer um filme sobre isto", mais ou menos actual, com mais ou menos crítica social e política. The Post vem na mesma linha de filmes como Lincoln, Bridge of Spies, War Horse ou mesmo Munique: um entretenimento inspirador, disfarçado de recriação dramática. O problema é que The Post só é bom entretenimento a espaços, e o interesse que Spielberg tem conseguido imprimir aos seus filmes mais recentes tem vindo a decrescer. Enquanto assiste a The Post é difícil para o espectador libertar-se da ideia de que ali está Meryl Streep a fazer de algo, ao invés de reconhecer uma personagem por si só, o mesmo acontecendo com Tom Hanks. Os veteranos actores, e principalmente Streep, tornaram-se já um símbolo de qualidade politicamente correcto e, daí, quase inquestionável, como se fosse desnecessária a exigência para com as suas interpretações tal é o estatuto já alcançado pela actriz, que ano após ano soma nomeações para os maiores prémios da indústria seja com que filme for, seja ela uma Bianca Castafiore falhada em Florence Foster Jenkins, seja uma bruxa má num filme medíocre como Into the Woods. Em The Post, ao interpretar uma milionária dona, por via das circunstâncias, do importante jornal Washington Post que tem que tomar determinada decisão de superior interesse da nação vs liberdade de imprensa, Streep não se despega nunca da sua própria imagem contemporânea, de uma teatralidade forçada, nem de uma mensagem de elevação feminina que parece ter sido apresentada por requerimento. Por outro lado, a actual Hollywood das passadeiras vermelhas tem-se ultimamente preocupado mais em fazer política e crítica social do que bons objectos fílmicos, raramente conseguindo juntar os dois. Um bom tema ou uma boa mensagem nem sempre é sinónimo de um bom filme. Em The Post essa principal mensagem é o paralelismo que é feito entre a administração Trump e a sua "guerra" contra a comunicação social e aquela que foi feita por Nixon antes de rebentar o escândalo Watergate. No entanto, o transporte dessa mensagem para longa metragem, "trocada por miúdos", não é mais do que o momento da decisão de publicação de determinado conteúdo governamental sigiloso, sofrendo de excessivo arrastamento e dramatização, que não se coíbe de usar e abusar da sala de montagem para criar interesse e atenção artificiais sobre um momento que, sem adornos, não os teria. Por tudo isto, apesar de agradável, The Post é um filme irrelevante do ponto de vista criativo. Compará-lo ao brilhantismo dos diálogos de Os Homens do Presidente ou o suspense pragmático de Spotlight é uma afronta. Não estão sequer no mesmo campeonato.

Porque é bom: Mecânica interessante entre personagens; reconhece-se o esforço de Spielberg em criar interesse num episódio real que, por si só, não o teria.

Porque é mau: As interpretações de Meryl Streep e Tom Hanks, e principalmente da actriz, são superficiais e infundadas; uma mensagem política e social transportada para filme de forma atabalhoada, com diálogos e cenas que só existem para encher chouriços; está a milhas da qualidade de diálogo e suspense pragmático de Spotlight e Os Homens do Presidente.

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